domingo, novembro 19, 2006

Noite no sofá

Passei quase toda a madrugada pensando no meu pai. Se ele gostava ou não de quando ainda menina chupava aquela mamadeira agarrada nos cabelos dele. Sempre o acordava assim. As sete da manhã! Talvez tenha sonhado um pouco também. Mas não consigo mais fazer esta distinção. Entre a ilusão e o real, sei que ele me acompanhou a noite inteira.
Acho que adormeci um pouco no sofá de couro da sala. Onde passávamos bastante tempo juntos. Eu, no menorzinho e ele, no grandão, que já tinha um pouco a forma do seu corpo. Fechei os olhos e estiquei o braço, como costumava fazer. Lembrei-me da maneira com que ele tocava meu braço e tomava-me o pulso: sem medi-lo, sem enquadrá-lo no compasso clínico. Mas como quem sentia, enquanto conversávamos, o meu som orgânico...
...parece assim, ter a certeza de que vivo, de que sinto aquele momento também. É a sua medida das coisas, da minha vivacidade, da minha juventude, da minha tristeza. Escutamos um disco inteiro com ele assim: agarrado ao meu braço, os dedos indicador, médio e anelar pressionando levemente o encontro do braço com minha mão. E eu sentido minha artéria empurrando os grandes dedos do meu pai. De maneira absolutamente rítmica, apenas por vezes descompassada pelo contra-tempo de uma risada. Ele sente tudo isso com a sensível ponta dos seus grosseiros dedos. Força medida, controlada. Minha mão inteira fecha, única, somente seu polegar. Sinto-me pequena...
Abri os olhos,
ele não estava lá.
Saudade...

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Vou repetir o cometário do texto de baixo:
Juju, que coisa linda!!
Fiquei com lágrimas nos olhos.
Beijo.

11:14 AM  

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