Bicho-preguiça
Outro dia assisti ao filme Depois da Vida, do Hirokazu Kore-eda. Numa espécie de repartição pública do além, cada um que morre deve escolher uma lembrança da sua própria vida com a qual deve partir para a eternidade. Hoje que meu pai faria 59 anos, escolho esta.
Ao final da tarde, quando o sol penetrava a terra, meu pai retornava da pescaria. Falando alto e pitando um cigarro no canto da boca que parecia não acabar nunca, ele chamava a atenção de todos na casa. Logo pegava sua xícara e enchia com o café novo que certamente sempre o aguardava. E, depois, ainda meio saltitante, começava a organizar e guardar sua tralha de pesca. Sempre auxiliado por alguma das mulheres apaixonadas pelo homem mais sedutor que eu já conheci, esse processo era rapidamente concluído e tão cedo estava ele na segunda xícara, agora acompanhada por um pão de onde escapava manteiga, com uma mordida menos cuidadosa.
Eu ficava esperando, ansiosa, o momento em que ele, ainda com aquele cheiro acre de protetor solar e suor, se deitava na rede e fechava os olhos. Eu chegava mansa e com um beijinho o despertava para que ele, mesmo sabendo das minhas intenções, me perguntasse: quer deitar aqui, gatinha?. Sem falar nada, só com um gesto afirmativo da cabeça, eu o fazia afastar-se um pouco e me envolver naqueles braços grandes e fortes que me sufocavam. Tentando compassar minha respiração com a dele, que era longa e lenta, eu adormecia nos seus braços, ao som do mar que era tanto dele.
Ao final da tarde, quando o sol penetrava a terra, meu pai retornava da pescaria. Falando alto e pitando um cigarro no canto da boca que parecia não acabar nunca, ele chamava a atenção de todos na casa. Logo pegava sua xícara e enchia com o café novo que certamente sempre o aguardava. E, depois, ainda meio saltitante, começava a organizar e guardar sua tralha de pesca. Sempre auxiliado por alguma das mulheres apaixonadas pelo homem mais sedutor que eu já conheci, esse processo era rapidamente concluído e tão cedo estava ele na segunda xícara, agora acompanhada por um pão de onde escapava manteiga, com uma mordida menos cuidadosa.
Eu ficava esperando, ansiosa, o momento em que ele, ainda com aquele cheiro acre de protetor solar e suor, se deitava na rede e fechava os olhos. Eu chegava mansa e com um beijinho o despertava para que ele, mesmo sabendo das minhas intenções, me perguntasse: quer deitar aqui, gatinha?. Sem falar nada, só com um gesto afirmativo da cabeça, eu o fazia afastar-se um pouco e me envolver naqueles braços grandes e fortes que me sufocavam. Tentando compassar minha respiração com a dele, que era longa e lenta, eu adormecia nos seus braços, ao som do mar que era tanto dele.
4 Comments:
Ai!
"Ex.: quem já vivenciou a perda de um parente conhece a dor que estou sentindo."
Esse exemplo, encontrei no Houaiss. Depois da definição da palavra "vivenciar", aparece como uso possível.
Sobre o texto, digo: é uma quintessência da vida em comum que vocês tiveram.
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
ai, ai,... sua lembrança me trouxe lembranças também. Me lembro muito bem da sua relação com seu pai, o chamego(se é assim que se escreve) que exisria entre vocês lá no sofá da sua casa. Um amor único, que nunca havia visto nessa relação pai-filha, o que sempre me impressionou e me cativou... o amor que guardás contigo, juju!
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